Como fotografar a emoção? José Sena Goulão

22/10/2025 1h 3min Episodio 232
Como fotografar a emoção? José Sena Goulão

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Sinopse do Episódio

O poder de olhar: o que o fotojornalismo ensina sobre comunicar



Vivemos cercados de imagens.



Fotografias, vídeos, fragmentos de realidade que passam depressa demais.



Mas há uma diferença entre ver e olhar.



Entre registar e compreender.



Entre captar o instante — e perceber o que ele significa.



Como fotografar a emoção? José Sena Goulão.



Neste episódio do Pergunta Simples, a conversa é com José Sena Goulão, fotojornalista da Agência Lusa, autor de algumas das imagens mais marcantes da história recente de Portugal — como aquela, em pleno confinamento, de um homem sozinho a subir a Avenida da Liberdade com uma bandeira às costas.



Mais do que falar de técnica, esta conversa fala de sentido: do que o fotojornalismo nos ensina sobre comunicar com verdade, emoção e responsabilidade.



A fotografia como linguagem



Desde que existe, a fotografia é uma forma de comunicar.



De traduzir o mundo em luz.



De transformar o instante em memória.



Mas o mundo mudou.



Hoje, qualquer um de nós tem uma câmara no bolso.



E, com isso, o poder — e o risco — de publicar, manipular, distorcer.



A fotografia, que nasceu como prova, tornou-se um território de dúvida.



E é por isso que vale a pena ouvir quem continua a acreditar na imagem como linguagem de serviço público.



O enquadramento é uma escolha ética.



José Sena Goulão percorre há mais de quatro décadas o país e o mundo com uma câmara ao ombro: do Parlamento às bancadas do futebol, das cerimónias de Estado às praias de Carcavelos ao nascer do sol.



Para ele, o enquadramento é tudo.



É a linha que separa o que se mostra do que se omite.



E essa linha é sempre ética.



Na fotografia — como na comunicação — enquadrar é interpretar.



É decidir o que é essencial e o que fica fora de campo.



É escolher o foco, e com isso, construir um ponto de vista.



Toda a fotografia revela tanto de quem fotografa como de quem é fotografado.



E é nesse espelho — muitas vezes invisível — que se joga a honestidade do olhar.



A emoção é o centro da verdade



As fotografias que ficam não são as mais perfeitas.



São as que tremem, as que respiram, as que captam o que é humano.



Uma imagem pode ser tecnicamente irrepreensível e, ainda assim, vazia.



O contrário também é verdade: uma fotografia imperfeita pode ser comovente, memorável, real.



A emoção é o que transforma o registo em relato, e o relato em memória coletiva.



É o que liga o que acontece ao que sentimos.



E é também o que torna a comunicação — em qualquer contexto — profundamente humana.



A ética é inseparável do olhar.



Num tempo em que a inteligência artificial fabrica rostos que nunca existiram e paisagens que nunca aconteceram, o olhar humano torna-se um ato moral.



Fotografar — como comunicar — é assumir responsabilidade.



É compreender que há sempre uma fronteira entre mostrar e explorar, entre informar e invadir.



A credibilidade nasce precisamente daí:



da capacidade de respeitar quem está do outro lado da lente, do microfone ou da palavra.



O fotojornalismo, neste sentido, é mais do que uma profissão: é uma missão pública.



Ver, compreender e contar — antes que o ruído apague o essencial.



A verdade não é perfeita, mas é necessária.



A fotografia de José Sena Goulão no 25 de Abril de 2020 — um homem sozinho a subir a Avenida da Liberdade com a bandeira de Portugal às costas — tornou-se um símbolo desse compromisso.



Num país confinado, foi uma pergunta em forma de imagem:



o que é a liberdade, quando quase nada se pode ver?



Foi também uma prova de que a verdade não precisa de ser perfeita para ser poderosa.



Basta ser honesta.



E essa talvez seja a lição mais urgente sobre comunicação:



a verdade comove mais do que o filtro.



Comunicar é resistir à indiferença.



No fim desta conversa, uma ideia fica clara:



Comunicar bem é manter o foco quando tudo em volta distrai.



Ver, compreender e contar.



Três verbos simples.



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