XXXIII Domingo do Tempo Comum - C - Homilia

16/11/2025 6 min

Ouvir "XXXIII Domingo do Tempo Comum - C - Homilia"

Sinopse do Episódio

Ao aproximar-nos do final do ano litúrgico, a Palavra de Deus oferece-nos textos de tonalidade apocalíptica que, à primeira leitura, podem assustar-nos. Parece que tudo piora: guerras, perseguições, catástrofes. Mas, se escutamos com atenção, percebemos a mensagem contrária: apesar de todas as tribulações, Deus triunfará. A primeira leitura fala-nos desse “sol de justiça, trazendo nos seus raios a salvação”; o Evangelho confirma que, no meio do que treme e desaba, o Senhor permanece fiel. Para aqueles que se deixam iluminar e aquecer por Jesus, há salvação, há futuro, há vida eterna.É aqui que aparece a palavra “esperança”, que tantas vezes usamos sem perceber bem o que significa. A esperança na vida eterna pode tornar-se confusa se a reduzirmos a uma ideia. Posso formar na minha cabeça uma imagem da vida eterna, a partir de histórias que ouvi ou li, e depois limitar-me a esperar que isso aconteça. Mas, muitas vezes, o que chamamos esperança mistura-se com um sentimento muito parecido: o medo. Também o medo nasce de um futuro imaginado; só que, em vez de desejar que aconteça, tremo com a possibilidade de que venha a acontecer. A diferença entre esperança e medo não está no mecanismo interior, mas no conteúdo daquilo que projeto.A segunda leitura, da carta de São Paulo aos Tessalonicenses, mostra um modo errado de viver a esperança. Alguns cristãos, convencidos de que a vinda do Senhor era iminente, concluíram que já não valia a pena trabalhar nem assumir responsabilidades. “Se o fim está próximo, para quê cansar-me?”, pensavam. É a caricatura de uma esperança desligada da vida concreta: uma espiritualidade que olha para o céu e esquece a terra, que fala de eternidade, mas foge das tarefas de cada dia. Paulo reage com firmeza: quem não quer trabalhar, também não coma. A verdadeira esperança não desobriga da responsabilidade; torna-nos mais atentos e fiéis no pouco de cada dia.Talvez ajude distinguir entre esperança e desejo. A esperança pode ficar só na cabeça, como ideia que me agrada. O desejo nasce da vida: das experiências, dos encontros, das feridas e alegrias onde vou reconhecendo a passagem de Deus. Eu posso simplesmente esperar que o autocarro chegue; nada depende de mim, limito-me a aguardar. Mas, se desejo encontrar alguém que vem nesse autocarro, a minha espera muda: fico inquieto, atento, desinstalado. O desejo mobiliza o corpo, o tempo e as decisões.Também na fé não basta “esperar” a vida eterna como quem faz contas a um prémio futuro. Somos convidados a desejar a vida eterna, isto é, a deixar que ela se torne força viva no presente. Quando a desejo não apenas porque me falaram dela, mas porque, na luz da Palavra, reconheço que é boa, começo a viver de modo diferente. Procuro que essa vida de Deus cresça em mim e nos outros. A esperança deixa então de ser projeção futura e torna-se confiança ativa, que inspira escolhas concretas.Assim descobrimos algo decisivo: a vida eterna já começou. Não nasce no momento da morte; começa agora, cada vez que acolhemos o amor de Deus e o deixamos transformar o nosso modo de pensar, sentir e agir. Aqui, no tempo frágil, a vida eterna manifesta-se em “centelhas de eternidade”: momentos de graça e alegria em que nos sentimos habitados por um amor maior do que nós. São pequenos sinais de que o “sol de justiça” já se ergueu sobre nós e nos envolve com os seus raios de salvação.Celebramos hoje o Dia Mundial dos Pobres, e a liturgia propõe textos que, à primeira vista, podem parecer assustadores. Deus não nos quer paralisados pelo medo nem distraídos numa esperança vaga. Coloca diante de nós os pobres, os últimos, os que sofrem, para que o desejo de vida eterna se traduza em gestos de partilha, de justiça e de cuidado. Não caminhamos movidos por uma esperança adormecida, mas por um desejo vivo de vida eterna que Deus acende no nosso coração. Esse desejo faz-nos levantar, aproximar, servir e, assim, começar já aqui a viver aquilo que um dia se há de cumprir em plenitude.